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Deveres de Transparência

Em Março de 2017 o Bloco de Esquerda de Cascais propôs, em Assembleia Municipal, a criação de um Regulamento de Registo Municipal de Interesses e Impedimentos, tendo proposto que caberia à assembleia regulamentar a respetiva composição, funcionamento e controlo.

O Bloco de Esquerda sempre afirmou uma posição de defesa intransigente do reforço deveres de transparência, pugnando por uma sempre maior e melhor informação quer quanto aos eleitos, quer quanto aos detentores de cargos públicos.

Defendemos que devem estar sujeitos a um registo de interesses, e ao dever de declaração dos mesmos, todos e todas quantos façam parte dos órgãos e serviços da administração directa e indirecta do estado, bem como da administração autónoma, autárquica, directa e indirecta.

Em coerência, propusemos, em Assembleia Municipal, que se criasse um registo de interesses, por forma a tornar mais transparente a acção de cada um eleito naquele orgão.

Fomos e somos favoráveis a uma alteração ao Regime Jurídico de Incompatibilidades e Impedimentos dos Titulares de Cargos Políticos e Altos Cargos Públicos, Aprovado pela Lei 64/93 de 26 de agosto, no sentido em que se obrigasse à criação nos municípios e nas freguesias com mais de 10 mil eleitores de um registo de interesses, competindo às respetivas assembleias regulamentar a respetiva composição, funcionamento e controlo.

Esse registo deveria ser disponibilizado no sítio na Internet da entidade respetiva.

O PCP e do Bloco de Esquerda, apresentaram, na Assembleia da República (AR), projectos de lei que visavam aprofundar ainda mais o dever de transparência, quanto a incompatibilidades e impedimentos dos agentes do Estado, em especial os eleitos, sejam de que órgão forem…

A posição assumida pelo Bloco de Esquerda vai de encontro com a posição da Associação Nacional de Municípios, que quanto ao tema em apreço se pronunciou, dizendo que, e passamos a citar:

Os autarcas não pretendem regimes excecionais que os desresponsabilizem dos seus atos.

Pretendem, pelo contrário, a criação de um mecanismo de responsabilização mais justo para aqueles que, no exercício das suas funções, tomam decisões dando por rigoroso e conforme à lei o conteúdo das informações e pareceres técnicos dos seus serviços, que as suas decisões acolhem.

Assim, impõe-se criar um regime mais adequado para os titulares dos órgãos das autarquias locais que os responsabilize, quando os mesmos deliberem ou decidam contrariando as informações técnicas dos serviços autárquicos.

Ou seja, não só defendem que não deverá existir qualquer regime excepcional para os autarcas, como ainda elevam o grau de exigência fortalecendo o laço entre a sustentação e a própria deliberação, mostrando o caminho da responsabilização dos agentes políticos quando falhem em seguir as informações e pareceres técnicos dos seus serviços.

Pessoalmente, julgo que é um caminho exagerado, pois a sua maior punição será sempre política, mas defendo a obrigação de menção das informações e dos pareceres dos serviços, e concomitantemente, a obrigação da justificação do porquê destas não serem seguidas.

Também a título pessoal, defendo a posição da Ordem a que pertenço e que foi apresentada a 21 de Junho de 2016, aplaudindo todas as iniciativas que visem o aumento das regras de transparência e da integridade, defendendo da total incompatibilidade dos solicitadores e dos advogados com o exercício do cargo de deputado, devendo aqueles suspenderem a sua inscrição nas respectivas ordens enquanto durar o seu mandato.

Que não fique aqui nenhuma dúvida, quer quanto à natureza do que é defendido pelo Bloco de Esquerda quanto à transparência, incompatibilidades e impedimentos, quer quanto ao alcance daquilo que aqui foi defendido…

Se a qualquer um está aberto o exercício de um cargo politico ou público, a esse ficará a responsabilidade e vinculação de defesa do interesse público, e nunca de um interesse privado, seja ele individual ou colectivo!

Se alguém quiser defender o seu direito à reserva dos seus interesses, então saberá que ao exercer um cargo público, seja ele politico ou de outra natureza, será sempre escrutinado, estando sujeito a qualquer dúvida ou suspeição, que destes derivem.

É o exercício de um direito que ocorre no âmbito do livre arbítrio de cada um…

E não temos aqui qualquer violação do princípio da presunção de inocência.

Há sim, uma demonstração do empenho dos políticos na moralização da acção pública e na justificação da sua conduta.

Nesse sentido, veja-se a opinião do Sr. Dr. Manuel Magalhães e Silva na AR em sede de comissão, a 21 de Setembro de 2016, em que o mesmo veio afirmar publicamente que “relativamente a titulares de cargos públicos e equiparados, há um sentimento instalado na comunidade de que há um dever especial de transparência relativamente à sua situação patrimonial e aos seus interesses. Há uma necessidade reconhecida de alargamento do dever de transparência a todos os agentes políticos e detentores de cargos públicos.

Lembremo-nos do contributo que a Plataforma de Associações da Sociedade Civil – Casa da Cidadania, em 12/07/2016, deu ao debate e à apreciação dos projectos de Lei já mencionados:

É opinião desta Plataforma associativa que:

O “Registo de Interesses” deve ser também obrigatório a todas as autarquias locais, independentemente do seu número de habitantes”.

O Bloco de Esquerda de Cascais defendeu, e continuará a defender, que também ao nível autárquico, deverão as respetivas Assembleias, enquanto órgãos fiscalizadores, criar e regulamentar um registo de interesses que abranja todo o universo politico autárquico, incluindo empresas municipais e demais participações municipais em outras entidades, garantindo que cada cidadão possa saber, a cada momento, quem está no cargo público e quais os seus interesses privados, que possam vir a conflituar com o interesse público que deve representar.
 

Luís Salgado

Artigo originalmente publicado no site portalcascais.pt