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De novo os regimes complementares de pensões

 

                                                            

                                                                   

 

É enternecedor ver como a Confederação Empresarial/CIP dá a mão ao setor financeiro com interesses na privatização do sistema de pensões.

 

Recentemente foram notícia as propostas da CIP para o Pacto Social. Uma das propostas interessa-nos em particular. Diz a CIP que aceita um possível aumento extraordinário de 14,75% nos salários, com a contrapartida de uma redução temporária da Taxa Social Única (TSU) e em que 10% desse aumento seriam incluídos num plano individual de reforma no regime público de capitalização. Temos assim a introdução de planos complementares privados de reforma nas empresas, isentos de IRS e TSU, e obrigatórios, é claro. Percebe-se a importância de envolver a UGT, pois um dos meios para tornar obrigatórios estes planos de reforma é a negociação coletiva nas empresas.

As conclusões da Comissão criada pelo governo, em 2022,para realizar um livro verde para a sustentabilidade do sistema previdencial serão, previsivelmente, outra porta de entrada para este tipo de propostas. Apesar do adiamento da entrega das suas conclusões, já foi divulgado pela imprensa que a comissão avançará com um conjunto de sugestões para incentivarem cidadãos, empresas e Estado a apostarem nos regimes complementares.

A defesa do aumento da provisão privada das pensões de reforma com modelos de capitalização, em detrimento de se procurarem novas formas de financiamento do sistema público de pensões e de se garantir o trabalho com direitos, faz hoje parte da agenda da União Europeia que afirma a necessidade de uma reforma das pensões que inclua, entre outras medidas, a constituição de poupanças-reforma complementares privadas (Livro Branco da Comissão Europeia, 2012).

Os riscos dos modelos de privatização das pensões são conhecidos: a cobertura e as prestações não aumentaram, individualização do risco e imprevisibilidade do rendimento da reforma, dependência do funcionamento e evolução dos mercados de capitais e das escolhas das aplicações financeiras, custos de transição onerosos para os Estados e transferência de recursos públicos para garantir o pagamento de pensões no caso de insolvência dos fundos de pensões, aumento das desigualdades sociais. Em muitos países onde se fizeram reformas a favor da privatização das pensões, impulsionadas pelo Banco Mundial, houve reversão total ou parcial dessas medidas (Relatório Mundial sobre Proteção Social, OIT, 2017-19). As crises financeiras realçaram a vulnerabilidade deste modelo, com perdas avultadas dos fundos de pensões internacionais.

É preciso defendermos o nosso sistema público de pensões de reforma, como o único que garante a cobertura universal, a solidariedade intergeracional e intrageracional, o combate à pobreza e à desigualdade social, proporcionando a segurança económica a que têm direito as pessoas idosas.

 

Publicado no APRe! Noticias 08, Setembro 2023

Publicado no ESQUERDA.NET Opinião, Outubro 2023

 

 

*Berta Alves, professora aposentada, membro da coordenadora concelhia de Cascais do BE, membro do Grupo +60 do BE